Individuar-se… tornar-se um ser humano único, conscientemente. Sair do rebanho, não pertencer – no sentido de identificar-se como sendo – a uma massa, não ser norteado por padrões sociais nas escolhas mais importantes da sua vida…
Optar por caminhos que não sejam atalhos… e decidir a partir do que a sua alma anseia e não pelos padrões paternos, parentais e sociais clamam, seduzem e atraem… Evitar os atalhos para satisfazer exclusivamente à sua vaidade egóica, à sua imagem social… Não ir pelas metas a curto prazo, aquelas cômodas, que não te exigirão tanto…
Cada vez mais vejo a obra alquímica de tornar-se individualizado (na acepção de Jung) como um árduo processo a longo prazo de constante autossuperação… Muitas vezes, a respeitabilidade egóica precisa ser sacrificada nesse processo… Dostoievsky sofreu com a pobreza, a prisão, a doença, a incompreensão. Jung renunciou a uma posição de destaque se continuasse seguindo Freud, parou de dar aulas na Faculdade e mergulhou na imaginação ativa durante anos, reduzindo seus atendimentos (teve a sorte de ter uma mulher com dinheiro para viver e sustentar seus filhos). Outros não têm essa sorte, tais como o escritor russo citado e outros tantos, bem como artistas.
E o grande desafio, especialmente para o homem, é não calar a voz da sua alma diante das responsabilidades familiares, profissionais e materiais. Muitos acabam soterrando sonhos por concentrar-se em exagero às demandas externas, à busca da estabilidade e/ou do sucesso. Não é à toa que a CRISE DA MEIA IDADE vem abalar as estruturas, a aparente sensação de segurança, o apego a uma posição social e profissional de “respeito.”
Costumo ver o quanto a CRISE DA MEIA IDADE é a crise da VIDA NÃO VIVIDA. É por isso que tantos homens fazem tanta merda quando ela bate à porta…. Destroem famílias, mergulham numa vida dupla (com cada parte bem escondida da outra), entram em esquemas ilícitos, são encantados por ilusões, desbundam sexualmente, se anestesiam com os excessos (de droga, comida, bebida, trabalho, etc.).
Todo excesso paga seu preço… Primeiramente, com o excesso do outro extremo. Sei bem disso quando vivi uma fase de fuga das questões materiais, financeiras e profissionais nas minhas experiências “espirituais” em meus vinte e nove anos de vida. E depois me deslumbrei com a conquista financeira, com aquisições materiais, com o prazer material e o poder do conhecimento daquilo que trabalho. Esses extremos são compensatórios e necessários para atingir o equilíbrio, tal como uma pessoa muito agressiva e até mesmo violenta passa para o oposto da passividade e da submissão pacífica.
Em 2010 vivi – creio eu – a crise da meia-idade. Nada que conquistava, conseguia e obtinha de sucesso e respeitabilidade já não me satisfaziam. A satisfação durava um dia. No outro, o vazio existencial já se fazia presente. Nada do que fazia, tentava fazer, supria esse buraco na minha alma. Percebi que qualquer movimento externo, yang, de conquista que buscava empreender era uma tentativa desesperada de ver se o próximo objetivo alcançado me traria paz… Eu vivia o Ano Pessoal 9 (eis um que é a cara da CRISE DA MEIA IDADE… vivemos – nem que seja num grau de intensidade menor – os sintomas dessa fase que não tem idade certa para ocorrer a cada Ano Pessoal 9).
Não tem ano mais produtivo para desenvolvermos a humildade do que o simbolizado pelo 9. Estamos completamente entregues a um processo existencial que vai além do nosso controle. E não adianta querer tentar controlar os eventos, as pessoas, as relações… a vida vai dar um jeito de nos “humilhar”, de nos colocar de joelhos. Vai mostrar que a força do fluxo da Vida é muito mais forte do que a tentativa controladora de nosso ego.. que nossa vontade.
Daí a importância de aproveitar essa fase (CRISE DA MEIA IDADE e/ou ANO PESSOAL 9) para refletirmos sobre o que não nos satisfaz. E não entrar na ânsia de querer conquistar cada vez mais, ganhar cada vez mais, ter um sucesso ainda maior… Porque isso só será um “tapa buraco” muito porcamente feito – que aumentará nosso vazio quando percebermos que o buraco é mais embaixo.
O que a vida está pedindo é justamente um contato com a alma nesse balanço existencial que tal fase aponta. E identificarmos os sonhos de infância – ou mesmo adolescência – acalentados durante algum tempo e que não tivemos a coragem (ou as necessidades e responsabilidades familiares e profissionais não nos permitiram) de seguir. São esses sonhos que trarão a satisfação de nossa alma, que nos alimentarão, que nos trarão paz.
O detalhe: não é a realização em si desses sonhos. Mais importante: é o processo de realiza-los… o quanto nos aprimoraremos enquanto pessoas durante essa jornada que irá constantemente trazendo VIDA para nosso dia-a-dia. Aí não nos sentiremos tão pesados, massacrados pela rotina e pelos afazeres diários no trabalho e/ou em casa. Não arrastaremos corrente para ir trabalhar, para voltar para casa, para lidar com nosso cotidiano. Teremos um propósito maior e nos dedicaremos, um pouquinho a cada dia, a essa obra. Viveremos o verdeiro prazer que é viver com um significado e a ele nos dedicarmos… Ele nos alimentará, diariamente, durante um bom tempo, o tempo que continuarmos nos envolvendo com nossos sonhos.
Porque a vida é uma obra a ser realizada a longo prazo…
Beijãozão nocês…
Yub